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Palavras esquecidas

Prepara as palavras, veste-as de delicadeza e afecto, dá-lhes coragem e compromisso. Eu levo o papel e o lápis para, quando chegar, te escrever na eternidade.
 
Não quero a tua virgula, o teu ponto ou a tua exclamação. Quero o teu cheiro e o silêncio do teu sabor, quero sentir a sabedoria do teu olhar, quero ser de ti e em ti, quero partir contigo, admitir a saudade e dar corda ao desejo, quero embarcar de novo, reinventar o prazer de navegar o corpo, quero tornar afável um vento que sopra a urgência do teu destino.
 
Promete que continuas em mim, nessa absurda simplicidade que criamos sem qualquer pudor.
 
Onde fica o céu?
Eu sei que esse dia vai chegar, o caminho está a acontecer, está a ser vivido em cada gesto, cada passo, cada palavra e cada olhar, um caminho que me faz pensar no percorrido e me faz sonhar com o que vou percorrer. É um caminho solitário de tantas pessoas que me acompanham, é um grito mudo de palavras que se não dizem, enterro os pés na areia e caminho com a dificuldade que daí ...advém, no horizonte, avisto aquele traço que junta o mundano e o divino, todos nós o conseguimos ver, muito poucos o conseguirão alcançar. Eu tenho esse propósito, caminhar até esse destino, até ao momento onde posso tocar o divino ao mesmo tempo que me sepulto no mundo, esse que me chama e me deixa sem chama, esse que me completa sem perguntar quem sou, sinto-me preso, sem força para perceber a força desse bocado de terra que me acompanha. Onde estás tu? Onde ficas tu para lá dos meus olhos, para lá do meu sonho, de nada me adianta querer chegar à fala contigo, da transcendência da tua natureza, herdei esta vida para que um dia a morte faça sentido, a morte que um dia acaba com a vida mas que jamais acabará com este sentimento. Espera por mim nesse lugar que um dia será só nosso, nesse enigma que visto daqui faz sentido e é finito, porque tu existes e é em ti que consigo ser o que procuro, o céu é apenas um lugar, e esse lugar só faz sentido se, quando o tocar, te conseguir sentir.
 
Hoje, vou esperar por palavras tuas, aquilo que estou a sentir em silêncio.
 
Este silêncio de esperar inquieta-me. Por momentos, brilham os olhos, misturam-se as vozes que sobram de um mar de palavras que pairam na minha cabeça, ondas que partem não sei de onde e que se estendem por algazarras difusas, deixando no ar desperdícios de sílabas sem préstimo e desarrumadas. Hoje, este tempo, ainda me consegue enganar.
 
Com quantos traços se afagará o sofrimento nos instantes em que o lápis escurece a folha onde tudo antes era imaculadamente branco? e porquê?
Ir atrás de respostas é, provavelmente, o que faz a diferença, encontrá-las é talento dos que são inquietos, gritá-las é, seguramente, romper com o equívoco e rasgar o silêncio.
 
Tenho saudade de me perder no teu olhar, de te encontrar entre quatro paredes de mundo, tenho saudade desse abraço e até tenho saudade de me esquecer de ti...
 
Diga-se, por fim, que as palavras significam o alvo sem fim à vista, para alguns, mero pretexto ou até um simulacro daquilo que pensam ser. Em arte, já sabemos, não há imitação. Ela, sempre, em última análise, alimenta-se da dignidade. De dignidade vivem os pensamentos e os desenhos que vamos pintando com o caminho da vida. Da dignidade emerge o corpo dos dias que fulgura, que é vário e opulento. Do que sobra de uns e outros se tece a matéria da ignorância porque é em uns e outros que a arte se expõe, alada e complexa. Assim me deixo ir por essa eterna saudade de, simplesmente, ser.
 
Sentir, tudo aquilo com que substituímos o silêncio das palavras sem nos importamos com as consequências.
 
Tudo se torna mais belo quando nos rostos nenhum rosto se repete.
 
É então que surge do diálogo, essa forma que se mantém em silêncio do amor, que apenas observa e faz do simples desejo o objecto do desejo de ser olhado.
 
Quando se ama as palavras e o que elas nos dizem, dificilmente conseguimos passar muito tempo longe delas, as minhas andam por aqui, a deambular pela forma em que me tornei, trocadas umas nas outras, muitas vezes por caminhos desencontrados, em viagens sem destino previsto, outras vezes paradas, sem propósito ou qualquer sitio para onde ir, umas com razão enquanto gritam, outras fechadas nelas pró...prias, umas perdidas por ruas desconhecidas, outras a bronzear-se sem nada querer dizer e ainda aquelas que carregam um silêncio perturbador. Por fim, aparece o destino de todas elas, um reencontro informal num presságio obrigatório para todas, para todas sem excepção, um sítio onde se revelam e onde o que são jamais voltarão a ser.
 
Resta a saudade de um novo dicionário, a viagem que percorro é a mesma, sinónimo de descoberta e aventura, costumo andar no caminho daquele real oculto, na dobra das palavras e das nuvens, dos sons e das formas, é um diálogo em silêncio, de silêncios e para os silêncios, onde a comum gramática é esquecida e transformada em vontade de....uma simples e única vontade de...
 

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